A edição número 16 deste festival ficou marcada pelo cartaz de excelência, mas também pela péssima qualidade do campismo/recinto. Se o cartaz não estivesse tão bem pensado, esta seria uma edição desastrosa deste festival. E comece-se já com as críticas: este festival teve a boa iniciativa de fugir à cidade e assentar arraiais no concelho de Sesimbra, e, ao contrário do que é divulgado, não é no Meco, mas numa Herdade - a Herdade do Cabeço da Flauta - que de praia não tem nada, antes sim um vasto pinhal. Em primeiro lugar, aquilo fica nos confins de Portugal, quase sem habitantes, um deserto no verdadeiro nome da palavra. Por este motivo, quem se deslocasse ao festival, ficava confinado a ficar no parque de campismo, onde pouca sombra era conseguida pelos pequenos pinheiros existentes, ou então teria de ir de autocarro para a praia. A sensação não é muito boa, são 4 dias em que só temos uma opção: apanhar sol. Como o sol do Sul é forte, o resultado são escaldões. Muita gente os sofreu, e sem oportunidade de os curar, visto que era preciso suar muito para encontrar uma sombra em condições.
Depois não existe qualquer tipo de comércio à volta, o que nos obrigava a ter de alimentar dentro do festival. O mais grave é que as portas do mesmo só abriam às 16:00h, o que proporcionava um jejum involuntário aos milhares de festivaleiros. Como se não bastasse, todo o recinto tinha um solo com uma areia que libertava um pó medonho, e aqui a organização falhou logo à partida porque este piso é impróprio para estes eventos. Como tal só com lenços se conseguia estar, e mesmo assim não chegavam. Outra falha grave e gritante foi a reduzida quantidade de chuveiros que disponibilizaram: eram cerca de 20 chuveiros que, como é óbvio não chegaram para dar vazão a toda a gente e proporcionava filas intermináveis que chegava a atingir a meia centena de pessoas.
Carregar telemóvel é tarefa que se poderia, à partida, esquecer. A barraca da EDP localizada no recinto tinha meia dúzia de carregadores, e nem todos os modelos constavam, para agravar mais a situação. A revista feita aos festivaleiros na recepção ao festival foi do aparato mais estúpido alguma vez visto: cães farejadores, polícia, podia-se pensar que se estava na presença de delinquentes ao mais alto nível. Absurdo. Aquilo parece que foi só para amedrontar o pessoal, pois nos dias que se seguiram pois não houve tão apertada revista. Como já deu para perceber, tudo correu mal na estadia nesta Herdade, vamos passar à música, que foi o que levou as pessoas ao festival.
O primeiro dia ficou marcado pelo palco secundário e a trupe
indie mais requisitada de momento. St. Vicent, Beach House, Temper Trap e Grizzly Bear são bandas que actualmente têm grande atenção, e fez muita gente não sair deste palco. Neste palco só deu para dar atenção aos Grizzly Bear, e passar os olhos por Beach House e St. Vicent.
Beach House já tinha sido visto em sala em Guimarães este ano, e espantaram. Em festival não se portam mal, e até ganham alguma potência que não é sentida numa sala fechada.
St. Vicent não tem nenhum talento imaculado, é tentar fazer diferente sem sucesso: nem todos podem ser bons. Já
Grizzly Bear foram magistrais, com um palco bem apetrechado com um jogo de luzes inspirado no seu vídeo de "Two Weeks". Não se vislumbra líder nato desta banda, todos têm um papel de comando, e mesmo o vocalista principal muda a cada música. O coro, esse, é perfeito, mostrando-se dos musicos mais dotados da actualidade.
Pelo palco principal houve surpresas (ou confirmações para alguns): Jamie Lidell de corsários e havaianas deu uma verdadeira lição de música. Ter um musico deste calibre e com álbuns de grande qualidade como o Multiply, já editados, é quase pecado. Jamie Lidell transforma o palco à sua medida, e não se deixa acomodar por um alinhamento básico: por duas vezes deu largas à imaginação e improvisou (?) sessões de beatbox. Num misto de soul, electónica e R&B, Jamie Lidell deu um verdadeiro show.
Mayer Hawthorne & the County é favor trazer esta banda novamente a Portugal num futuro próximo: mas que arrebatadora actuação. Se duvidas existissem em relação à excelente qualidade musical deste senhor, estas desapareceram. À semelhança do que lhe antecedeu, este é outro cantor branco, mas que deve ter uma costela afro. De laço peculiar e smoking, a cada momento que Mayer abraçava o microfone transformava-se num lança-chamas de groove, com muito romantismo à mistura, resultado das suas letras pinga-amor. Momentos relaxados como "Just Ain't Gonna Work Out" e outros mais empolgantes como "Maybe So, Maybe No", mantiveram o publico divertido, a mercê também de algumas piadas do cantor.
Cut Copy e Pet Shop Boys, por outro lado, não deslumbraram. Cut Copy até se encontraram bastante perdidos na primeira parte da actuação, mas depois conseguiram entrosar-se e dar uma concerto razoável: as novas músicas tocadas estão boas, e já começam a gerar alguma expectativa sobre o sucessor de In Ghost Colours. Pet Shop Boys não serviu mais do que satisfazer os mais nostálgicos. O espectáculo visual é de facto muito bom, mas já não têm o mesmo carisma dos saudosos anos 80.
Se há coisa que se deve ter em atenção, e em especial nestes festivais de cartaz cuidado, são as primeiras bandas a tocar. Neste dia, os perfeitos desconhecidos
Sweet Billy Pilgrim deram um espectáculo de encher as medidas aos mais atentos. Surgindo do nada, surpreenderam tudo e todos, com uma música que quebra barreiras do convencional: country-rock com acrescentos de pós-rock, resultando em alguns momentos de inspiradas improvisações. Daqui por um ano já vão andar na alta roda.
Holly Miranda foi outra das revelações da hora do pôr-do-sol. .Um misto de Pj Harvey e Cat Power dos tempos do rock, irrompeu os ares com bastante pó da Herdade com vontade de "dizer presente". A adesão do público foi instantânea, como se Miranda já tivesse uma pequena legião de fãs em Portugal. Foi com "Waves" e "Joints" que o publico delirou e cantarolou a espaços.
Colocar Vampire Weekend a cabeça de cartaz quando a abrir temos Hot Chip, é somente uma jogada comercial. Hot Chip são uma banda de renome, com diversas provas dadas da sua qualidade acima da média e não ficava nada mal o lugar de cabeça de cartaz de festival. Porque foi de longe o melhor concerto do dia, e conseguiram angariar ainda mais fãs. De inicio a fim foi como que se entrássemos uma pista de dança em que o dj fazia anos: todos os êxitos foram tocados, e inclusive uma das melhores faixas do ano que é "I Feel Better". Um festão sem fim, e no final todos comentavam o excelente concerto assistido. Vampire Weekend foi o concerto do histerismo esperado, que embora tenham lançado um bom álbum este ano - Contra - ainda não aguentam bem o estatuto de cabeça de cartaz. Teve demasiados momentos mornos, que nem os momentos Dick Dale de "Cousins", e outras que tais fizeram esquecer.
Julian Casablancas foi o carrasco do dia, com um concerto a começar mal - um atraso de 20 minutos - e que acabou à hora programada, o que transformou este, num concerto flash. A sobriedade não existe em Casablancas, e o arrastar no palco foi notório de inicio a fim. Os pontos altos foram as músicas que tocou dos Strokes, "Hard to Explain" e "Automatic Stop", e serviu para atiçar o gostinho pelos que desesperam por um concerto desses senhores.
Este era o dia grande, aquele em que iríamos ver de perto a lenda viva, de seu nome Prince. Para gáudio dos presentes
Prince apresentou uma setlist revivalista, com os 70s e o funk como assunto da noite. Aqueles solos intermináveis, o coro negro e um tocador de harmónica excelso marcaram uma noite especial, que ainda contou com a presença de Ana Moura, com Prince a improvisar sobre "Vou Dar de Beber à Dor" e "A Sós Com a Noite". "Kiss" e "Purple Rain" levaram ao delírio o publico presente, e Prince retribuía a atenção com um "I Love Portugal". Felizardos foram os que estiveram neste concerto.
Num outro campeonato estiveram os The National, que, não fosse a presença de Prince e tinham assegurado a pole position dos melhores concertos. O hype aparecido com este último álbum foi sufocante, aparecendo coisas escritas na imprensa especializada que nem os próprios membros da banda devem concordar/acreditar. Apesar dos êxitos maiores constarem em anteriores álbuns, o novo - High Violet - é o mais bem pensado e sucedido enquanto matriz "álbum". Agora que as coisas estão mais calmas, The National decidiram agitar as águas ainda turvas, perante um dos melhores públicos de sua pertença - o publico português. As danças estranhas do vocalista Matt Berninger são o emular dos movimentos de Ian Curtis e a pose ao microfone à imagem de Stuart Staples dos Tindersticks. Propositado ou não, o que é certo é que estas referências aparecem logo à memória. Fora hypes e comparações, a categoria imposta pelo colectivo dos The National é, de facto, extasiante. Em palco constituidos por um trompestista, um saxofonista, um baterista, dois guitarristas, um violinista e um baixista, tudo funciona na perfeição. O "maestro" Matt Berninger passeia-se no palco com os seus ataques-de-não-se-sabe-o-quê e o épico funciona em seu redor. Vale a pena ver The National, nem que não seja pela sempre magistral interpretação de "Mr. November".
O resto do dia não chegou aos calcanhares dos outros dois concertos: The Morning Benders deram o ar de sua graça, e pouco mais; Spoon foi o concerto do costume, da eterna banda-quase-lá; Empire of The Sun valem pelo espectáculo visual, com quatro bailarinas de qualidade superior, e um guarda-roupa com boa imaginação.
Para o ano este festival, a manter-se neste local, tem que melhorar a 200% a qualidade do campismo, e, se possível, manter a elevada qualidade do cartaz.